O QUE PODEMOS FAZER ANTES DO ADEUS DEFINITIVO

Este artigo retrata uma realidade que dificilmente queremos encarar. No final transcrevo uma carta linda e de teor emocionante.

O que podemos fazer antes do adeus definitivo?

Acredito que todas as pessoas deveriam lê-la, senão por outros motivos, apenas para lembrar que as pessoas queridas não morrem!

Elas permanecem vivas para sempre em nossa memória!

Muito amor, carinho e a construção de um bom relacionamento serão importantes para que as lembranças sejam positivas, agradáveis e isentas de culpas.

Gratidão e Meditação, Viva Mais Leve

A morte do sogro

Ele foi levado para emergência às 08:00hs, e às 10:00hs recebemos a noticia de que havia falecido. A morte em um hospital é sempre uma situação nova para qualquer família. Perguntei no serviço de enfermagem como seriam os tramites dali para frente e fomos informados que teríamos que esperar até que o médico fizesse o atestado de óbito.

Pouco antes do meio dia, sem que tivéssemos informação alguma, fui até a enfermagem e perguntei pelo atestado de óbito. – “Ainda não foi expedido” – foi a resposta seca da enfermeira.

Minha cunhada, considerada meio maluca por toda a família, olhou para mim e confidenciou que achava que haviam perdido o corpo de seu pai. Diante de tal suspeita ilógica, eu propus a ela que fossemos procurar o corpo dele.

A Constatação do óbvio

Andamos pelos elevadores e corredores até chegarmos ao necrotério. Como ninguém guardava a porta, entramos. Não precisamos procurar muito, o corpo do meu sogro estava sobre uma mesa metálica, nu e coberto apenas por um lençol branco da cintura para baixo.

Eu estava olhando para ele e me culpando por não ter lhe dado mais atenção, ele gostava muito de conversar comigo, tinha poucos amigos e sentia falta de alguém com quem pudesse colocar os assuntos em dia.

Naquele momento, olhando agora para o corpo pouco representativo do que fora em vida, o céu caiu sobre minha cabeça. Mesmo sendo agnóstico e não acreditando em vida após a morte, fiquei impressionado com o fato do desaparecimento do meu sogro. Onde fora parar toda aquela vida? Aquela personalidade forte e centralizadora? Aquele senso de justiça que chegava a incomodar? Aquela voz? Aquele olhar? Aquele modo de ser peculiar…

Porém, mesmo sem fechar os olhos, aquela vida estava presente nas minhas lembranças. Agora com muito mais clareza, mesmo sem fechar os olhos eu podia vê-lo da forma que ele era. Talvez até entender melhor os seus pontos de vista sobre alguns assuntos dos quais ele tinha uma opinião formada e irredutível.

De repente visualizei algo que embora soubesse, nunca tinha pensado mais pausadamente – ele viveria para sempre em nossas memórias! Descobri que as pessoas amadas não morrem, vivem para sempre em nossas lembranças. Só que não temos mais oportunidade de encontra-las; de interagir com elas; de nos desculpar ou de modificar qualquer coisa!

Todas as boas lembranças vinham carregadas de bons sentimentos, mesmo os momentos vividos com ele que não foram muito agradáveis, traziam lições que podiam ser aproveitadas no dia a dia. O orgulho por ter convivido momentos produtivos e agradáveis se alternavam com momentos em que as lembranças não davam nenhum prazer. Porém ficaram! E ficaram também os arrependimentos de não ter dito o que deveria ser dito e do que foi dito de forma inapropriada num tom inadequado ou no momento errado.

Outras lembranças

Lembrei do falecimento do meu pai ocorrido quase vinte anos antes. Ele também ainda estava vivo em minha memória. Desde quando eu era criança e o via como um super homem, grande e forte. O homem mais poderoso do mundo, capaz de nos proteger, a mim e aos meus irmãos, de forma indubitável e inquestionável. Desde quando eu era adolescente e o considerava fora de moda, “quadrado”, como se dizia na gíria da época, antigo e de ideias retrogradas. Desde que me tornei adulto e passei a considera-lo um sábio, capaz de criar sete filhos de forma a torna-los homens e mulheres de bem. Nenhum drogado ou drogada! Nenhum bandido. Nenhum marginal!

Lembrei e ainda lembro sua “Radio vitrola”, um móvel enorme que tocava discos em 78 rotações, que ele comprara de segunda mão com músicas clássicas que iam de Beethoven a Mozart, e algumas musicas antigas como “Pobres de Paris”, cantada por um francês com nome polonês, que ninguém conseguia falar o nome.

Todas aquelas lembranças ainda estavam vivas em minha memória. Não como eu queria que fossem, mas como eram na realidade nua e crua. Cheia de bons momentos e também de brigas e discussões cujas motivações para essas brigas, desde que ele falecera, podiam ser vistas como sem a menor importância, pareciam irracionais, sem nexo, que claramente poderiam ter sido resolvidas muito mais racionalmente e menos emocionalmente.

Uma nova atitude

A partir da morte do meu sogro, passei a valorizar mais a presença da minha mãe que já estava com 77 anos. A visitava, religiosamente, todos os finais de semana. A casa dela era um ponto de concentração da família, filhos, netos, primos e primas.

Procurei melhorar em muito o nosso relacionamento, sempre imaginando que quando ela falecesse eu teria uma imagem muito melhor, dela, de nossas conversas e dos momentos agradáveis que passávamos juntos. Não queria ficar com nenhuma culpa ou lembrança ruim. Sempre atendia os seus pedidos, na maioria simples: comidas, livros e quaisquer outras coisas que ela pedisse, mesmo que fosse sem nexo como uma Bíblia bilíngue em português e inglês que ela pediu embora ela não falasse nada no idioma, pedi ao meu filho para comprar uma em Londres e assim que ele a trouxe nas férias, eu a levei para ela.

Quando minha mãe faleceu aos 90 anos, eu estava em Londres com meu filho. Quando viajei quinze dias antes ela já estava hospitalizada, faleceu e foi sepultada um dia antes de minha volta. Neste dia meu filho não foi para escola e ficou comigo o dia inteiro, fizemos um brinde a ela em um bar em Nothing Hill. Enviei remotamente uma coroa de flores e me senti aliviado por ela finalmente se livrar das dores e sofrimentos que teve nos seus últimos dias.

Não senti nenhuma culpa, embora ela fosse uma pessoa difícil, todas as lembranças que haviam ficado dela, exceto dos períodos em que ela estivera doente, eram e ainda são, boas e agradáveis.

Ela continuou e continua viva na minha memória, assim como nas fotos e vídeos que fiz dela antes de seu falecimento e, na grande maioria, todas as lembranças continuam sendo agradáveis.

Hoje, tenho como norma, manter os relacionamentos com as pessoas que gosto em um nível saudável e respeitoso. Depois que descobri que as pessoas não morrem para quem as ama, quero sempre o melhor delas junto comigo… Enquanto eu viver… Das pessoas que deveria gostar mas não gosto, procuro me afastar para não ter um relacionamento conturbado.

…E você? Se um dos seus entes queridos partisse hoje, como essa pessoa estaria em sua memória? Será que as lembranças agradáveis seriam maiores que as ruins?

Mas fique em paz, ainda da tempo de mudar tudo…

A carta

A carta que transcrevo abaixo é de um dos meus pacientes que teve sua mãe falecida quando ele tinha 15 anos. Hoje, aos 32 anos ele precisou fazer terapia para, entre outros desconfortos psicológicos, melhor elaborar a perda dela e passar a ter uma vida mais plena com mais felicidade.

Por não ter o conhecimento ou simplesmente não prever (ninguém prevê) o falecimento dos entes queridos, seu sofrimento por longos anos foi cercado de culpa por não visita-la no hospital quando ela se internou para fazer uma cirurgia do coração e não mais voltou. Embora fosse um ótimo filho, não previu que sua mãe estaria viva para sempre… Só que na sua memória… Sem nenhum fato novo. Apenas nas boas e más lembranças existentes!

Hoje, seis meses após o início de sua terapia, ele ainda tem alguma dificuldade em expressar seus sentimentos e, talvez, ainda tente esconder suas emoções, mesmo com a esposa e familiares, porém, sinto que ele conseguiu se perdoar… Aliás, perdoar não a ele, mas perdoar o garoto que ele era quando ela faleceu.

Vamos a ela…

“Oi mãe!
Nossa! É tão difícil escrever essa carta, pensei um milhão de vezes em como começar, é tanta coisa para falar que pareço uma criança querendo dizer tudo de uma vez e na verdade não dizendo nada.

Tanta coisa aconteceu, tanta coisa que gostaria de fazer junto contigo, tanta ajuda que precisei, mas a vida nos pregou uma peça, lembro daquele dia exatamente como hoje, você estava de calça jeans, camiseta branca e jaqueta, cabelos pretos na altura dos ombros e com uma sacola nas mãos. Me disse que ia fazer uma cirurgia, mas que voltava logo, para eu ser obediente, cooperar com meu pai e minha irmã, eu estava desenhando um homem aranha, algo que desenho com frequência, acho que é a única coisa que eu consigo fazer que me deixa próximo e me leva de alguma forma até você, mas enfim, quando nos despedimos, eu te pedi uma coisa…

Para você voltar!

Você disse que voltaria…!!!!

Dias se passaram, eu me recusei a ir ao hospital, o pai a Ana (irmã), me cobravam muito de não ir lá, queria ter escutado eles, queria ter ido mais vezes. Porém, estar lá naquela UTI te ver só um pouco apenas, me deixava triste e fraco, era uma visão que eu não queria ter de você, e outra, você tinha prometido que iria voltar.

Teve um dia, mais precisamente um sábado, não fui te visitar, queria ficar jogando “bola” com o Alexandre, ficamos a tarde toda jogando bola quando meu pai chegou, ele estava com cara de decepção, me dizia que você estava muito triste comigo porque eu não fui te ver, mas que a senhora entendia o porquê, sabe mãe eu me pergunto, e muito, por que não fui te visitar tanto? A Ana ia todos os dias praticamente, ela simplesmente pegava o metro e ia … sozinha! Hoje tenho inveja disso! Ela deve ter tido vários momentos e conversas com a senhora que eu nunca tive!

Engraçado, eu nunca fiz um desenho para a senhora! Antes da senhora se internar, lembro que um aluno fez um palhaço chorando pra você e quando a senhora se despediu da classe, guardou esse desenho no seu armário! Como eu queria ter feito inúmeros desenhos que a fizesse ter a mesma postura ou sei lá…

Depois da cirurgia, lembro que cheguei em casa da escola e a Tia Denise estava muito feliz, tinha acabado de vir da UTI, a senhora estava bem, falando, conversando… Foi a última vez que alguém escutou sua voz! Me faz chorar por que lembro pouco da sua voz, mesmo tendo ouvido muitas vezes brigando com o menino levado que fui. Depois desse dia fui inúmeras vezes te ver, não tanto como deveria, te via deitada sentindo dor às vezes a sensação era de angústia, ou tristeza, aquilo doía, dói ainda, lembrar machuca, a senhora sempre foi e sempre vai ser a pessoa mais forte que eu conheço, que conheci! Tantas batalhas! Tantas guerras e ali estava!

No “ultimo” dia das mães, estávamos todos no quarto do hospital, Jonas, João, Vó Maria, Ana e meu pai, a enfermeira foi fazer um procedimento, a senhora abriu os olhos! Todos corremos e a chamamos, mas nada mudou. Lembro da vista do quarto do hospital, dos prédios em frente a janela, lembro que brincávamos, ficávamos olhando-os e pensando em quando você saísse dali iriamos dar risadas de tudo. Em meio a tudo isso o nosso sonho da casa da família estava sendo construído. Na época era engraçado  ver a Ana contando para a senhora, mesmo desacordada, de como as coisas estavam sendo feitas, as escolhas de piso, janela, portas e a cor da casa, engraçado na época, hoje eu choro ao lembrar, por que nem na sua mão eu segurei!

Depois disso tudo veio a parte que nos desligamos, no almoço, estávamos todos reunidos, depois de muito tempo, Ana, pai, Vó Inez e Tia Denise, quando recebemos a notícia do hospital… Dia chuvoso, cinza, frio, não sabia o que fazer, corri em desespero para o portão e fiquei na chuva, meu pai foi chorar no banheiro e não lembro de mais nada.

Lembro que meu pai pediu para a Ana ficar de olho em mim para não fazer nenhuma besteira, e não lembro mais de muitas coisas, velórios, pessoas, somente do meu pai de fora do velório e longe de mim e da Ana, mas foi difícil.

As coisas foram difíceis mãe, sua presença fazendo ausência em todo lugar, as viagens acabaram, os almoços, os jantares, os aniversários surpresas. como faz falta tudo isso… Todos reunidos, não só perdi a senhora mas perdi tudo, sinto falta da senhora…tudo que a senhora sempre proporcionou e tenho certeza que iria proporcionar, lembro quando a senhora me disse que queria conhecer minha namorada que ia sentir muito ciúmes dela ou quando fazia uma voz doce pedindo um neto, gosto de lembrar de nós dois desenhando na cozinha, sujando a mesa, mas só até a hora do jantar, porque a senhora tinha que preparar tudo, lembro dos salgados, dos bolos, das tardes de carinho, e aquele dia que saímos para dirigir e a senhora me disse que seria um ótimo piloto porque era um perfeito copiloto!

Às vezes realmente eu sonho que estamos um algum lugar verde, calmo, eu sentado do seu lado e contando tudo que aconteceu, tudo que que a senhora “perdeu”, mas não com raiva por não estar aqui, mas como uma nostalgia, a senhora ria, ficava brava, mas sempre me abraçava.

Sinto, às vezes, que a senhora pode bater na minha porta dizendo: – olha voltei vamos atrás de tudo que perdemos! Viajar, tomar cerveja – eu lembro que tomava um copinho – rir muito, desenhar, pintar, andar de mãos dadas no shopping, ir no cinema, ir ver a Vó Maria e visitar a casa da Ana!

Eu só gostaria de mais 1 dia… Matar a saudade, não sei muito bem o que iriamos fazer, fico fazendo planos, vamos para praia, vamos cozinhar, jogar muita conversa fora, ou apenas fazer nada.

Ontem, hoje e sempre eu irei te amar… Irei pensar na senhora, e dizer mais uma vez que te amo. Em meus sonhos e pensamentos irei conversar e pedir seus conselhos. Muitos beijos em seu coração minha mãe querida, minha rainha!”

Leitura complementar:

https://psicologobr.com.br/pequenas-mensagens-de-amor/

Denival H Couto – Psicólogo e Terapeuta – CRP: 06/17.798-SP

Atendo  ONLINE para todo o Brasil e exterior em língua portuguesa. Com 39 anos de experiência nas abordagens TCC – Terapia Cognitiva Comportamental e Terapia Fenomenológica Existencial.

“Meu objetivo é ajudar os meus pacientes a encontrar e quebrar as barreiras que atrapalham o desenvolvimento do completo potencial de cada um, assegurando uma vida mais produtiva, mais confiante e com muito mais qualidade.

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3 comentários em “O QUE PODEMOS FAZER ANTES DO ADEUS DEFINITIVO”

  1. Dirce Vieira

    Que linda e rica mensagem. Mensagem essa que me trouxe a uma reflexão sobre a morte em si. E mais ainda. O que é morrer? E o que fica, é o que marcou em nossas vidas sua existência aqui.

    Eu penso e acredito que a morte ou passagem do corpo físico é uma etapa de incertezas especulações e crenças diversas as quais se encerra um ciclo. O que acontece depois para os que se vão. Nada sabemos com certeza, apenas aquilo que acreditamos céu inferno paraíso novo lar enfim…. a não ser o corpo físico que é transformado em cinzas ou vai apodrecer em baixo de 7 palmos.

    Ok. E a vida que existiu os laços de família relacionamentos interpessoal….. amizades é tudo muito complexo. Eu acredito que muitas vezes só damos valor, quando perdemos. Por isso a importância de se viver intensamente o aqui e agora não deixar pra falar eu te amo depois. Pedir perdão se sentiu que magoou alguém antes que seja tarde. Fazer o bem respeitar o próximo suas ideias e crenças e viver tudo que se pode enquanto estiver aqui.

    Minhas experiências de mortes foram muitas e com sentimentos e saudades diferentes.

    Tive um irmão que foi amigo um cúmplice parceiro ele foi em vida meu herói. A maior referência de admiração masculina. Até maior e mais intensa que meu pai. Morreu com 40 anos dormindo, foi uma morte triste e linda ao mesmo tempo. Triste porque sempre foi um menino inteligente adorado por todos, admirado por sua dedicação carinho e atenção com todo mundo. Um jovem lindo paquerado por todas as garotas, um irmão prestativo defensor e atencioso. Depois se tornou um homem pai admiravel esposo profissional respeitado e fantástico amigo.

    Apesar de todos o predicados ele era um homem quieto, calado e nunca se abria com ninguém e nunca falava de si. Eu na época já era casada e morava em outra cidade. Ele perdeu o emprego de engenheiro numa grande empresa de elevadores, seu casamento entrou em crise e veio a bebida… em dois anos sua aparência era de um trapo humano perambulando pelas ruas, caído numa sargeta sendo ridicularizado por todos inclusive familia. Chamado de fracassado pelo meu pai sendo humilhado por todos. A única pessoa que ainda o acolhia era minha mãe e eu só recebia as notícias e sofria de longe, sempre que conseguia vinha a SP tentar falar com ele, mas tinha minhas dificuldades também. E isso é uma outra história. Enfim uma das últimas vezes que o vi com vida foi num hospital ele estava todo amarrado uma aparência horrível do corredor dava pra sentir seu cheiro de álcool e urina. Quando entrei no quarto ele se debatia estava delirando e duas enfermeiras tentavam controlar sua fúria para se desamarrar. E nisso entrei e falei com a voz embargada…. “e aí bele…” um jeito carinhoso que tínhamos de nos cumprimentar.

    Ele por um instante parou e as enfermeiras continuaram segurando e eu pedi para que elas nos deixassem a sós…

    Não aguentei e sentia uma lágrima escorrendo no meu rosto… segurei em sua mão fazendo um sanduíche com as minhas e ele respirava com dificuldades e murmurava baixinho…. você veio… minha irmãzinha…. você veio. (estou chorando nunca falei isso com ninguém e relatando aqui, vivi cada minuto intenso daquele dia… ) voltei….

    Quando ele se acalmou eu soltei uma das mãos e levei até seu rosto queimado, ferido e sujo…. comecei acariciar sua testa e seu cabelo… e ele falava coisas que eu não conseguia entender… uma mistura de fantasias delirantes e coisas reais. Pedia para eu levar os meninos dele na escola e tomar cuidado na hora de atravessar a rua. E ao mesmo tempo gritava cuidado o jacaré vai te morder. Foge dele…. depois ficava cantando baixinho e assim foi por umas 3 horas enquanto estava ali ao seu lado segurando sua mão. Depois vieram conversar comigo. Ele deu entrada sem documentos e como estava bêbado foi deixado lá de qualquer jeito até que um anjo mexendo em seus bolsos achou um telefone e ligou e era o meu.
    Me ligaram e eu subi a serra de Santos na mesma hora e não falei nada com ninguém. Só depois que entendi o real problema o qual ele e toda a família passava.

    Depois disso ele saiu do hospital e meu pai, deixou que minha mãe o trouxesse pra casa deles e entre confusões brigas e incompreensão de que ele não era um bêbado e sim um doente, ele decidiu ir morar numa comunidade com um mulher que o acolheu com amor e carinho enquanto toda a sua família lhe virou a cara. Minha mãe sofria mas nada fazia e eu longe não conseguia fazer nada além de orar e emanar boas energias e agradecer aquela mulher que o acolheu… num domingo primeiro de maio de 2000 feriado tinha corrida de fórmula um, e eu junto com meu esposo e filha tínhamos vindo visitar a família e ia aproveitar para procura lo.

    Veio uma pessoa no portão e chamou por minha mãe. Ela saiu comigo e minha irmã mais velha e juntas ouvimos daquele estranho. A Dona. R…. tá chamando urgente alguém da família na casa dela…. eu senti uma secura na boca e meu coração apertado….. minha mãe começou a chorar e passar mal. Minha irmã e eu a levamos pra dentro e fomos até o local acompanhado daquele homem que não falou uma palavra em todo caminho. Chegando lá eu já sentia o que nos esperava…. mas fui surpreendida pela visão que tive.

    Era uma casa simples. Muito limpa e irradiava uma luz um brilho que nunca tinha visto antes. Adentramos naquele minúsculo quarto e meu irmão estava lá. Lindo uma face meiga tranquila e um suave sorriso no rosto um olhar fixo no além algo inexplicável..

    Minha irmã gritou vamos levá-lo agora para um hospital… eu estava numa mistura de desespero e alegria porque a última imagem que tinha dele era aquela horrível do hospital a 3 meses atrás.

    Levei minhas mãos ao seu rosto e vim descendo fechando seus olhos e não sei explicar de onde vinha aquela força que me tomava sentindo meu corpo formigar. Falei… não irmã… ele se foi… não há mais nada a se fazer… e comecei a orar e ouvir o choro de todos em volta.

    Naquele dia senti a morte do meu irmão… vinham lembranças de nossa infância juventude. Nossas viagens, estudos, passeios sorrisos e eu guardo isso dentro de mim. O que ele tinha de melhor. Depois sofri e até fiquei com raiva de sua primeira esposa que o abandonou e meu pai que o rejeitou enfim…
    Voltando a morte. 6 meses depois em setembro do mesmo ano era meu pai que depois que meu irmão morreu, houve até comentário que ele não suportou a morte do filho e se entregou para morrer também.

    Meu pai bebeu a vida toda parou 10 anos antes de sua morte, já com vários órgãos comprometidos era muito bem cuidado por minhas irmãs eu não tinha uma relação muito amigável o respeitava como pai e até compreendia algumas de suas atitudes, porém não aceitava.

    Ele estava internado num hospital perto da minha casa e minhas irmãs acharam melhor deixar meu número de telefone já que qualquer emergência seria eu a chegar primeiro e rápido. Fui visitá-lo uma vez. Ele estava na UTI em como tínhamos 15 minutos pra compartilhar só um olhar com os demais irmãos. Olhei por aquele minúsculo vidro e vi um homem inchado paralisado sem vida…. era uma cena triste que trazia uma mistura de sentimentos emoções. Sentia raiva e dó ao mesmo tempo. Uma vontade de quebrar aquele vidro e correr para abraçá-lo ao mesmo tempo um desprezo por sua indiferença comigo…. (nossa!!. uma vida de terapia para entender tudo aquilo que sentia. )

    Sai dali com aquela imagem horrível na cabeça. Cheguei em casa e chorei muito nos braços do meu esposo.

    A noite por volta das 22 hs meu telefone tocou meu esposo atendeu e só murmurava … eu senti meu corpo arrepiar e peguei minha bolsa e falei. Vamos. Tá tudo bem… ele me abraçou e fomos. Em 10 minutos estava falando com uma pessoa no hospital e pedi para ver o corpo. A princípio negaram, fui firme e pedi novamente. Por favor e importante pra mim e preciso deste momento antes que o resto da família chegue. A moça suspirou e concordou. Por favor seja breve. Não quero perder meu emprego. Entrei numa sala pequena fria e lá estava ele nu e um pano em seu corpo. Meu esposo me segurava como se eu fosse desmaiar… e eu estava ótima…. abri o evangelho e li uma passagem….. depois comecei acariciar aquele corpo gelado e as minhas palavras vinham do coração. Pedi perdão por meus enfrentamentos e falei das minhas mágoas que sentia ele não me ouviu em vida . E disse olhando com raiva…. minha maior dor é que me orgulhava de você queria que você fosse meu super herói. Queria que você me desse um abraço e você nunca fez isso. E só então que meu esposo me abraçou e disse. Já chega para com isso . Vamos e eu comecei a chorar e abracei ele pela primeira e única vez na minha vida em 40 anos…. levantei. Olhei para ele mais uma vez e disse. Me perdoa eu só queria um abraço…. e foi meu último olhar. Durante o velório. Não quis vê-lo no caixão.
    A morte dele pra mim é estranho até hoje…. não tenho boas memórias dele só lembro dele bêbado ou me ferindo com palavras ou debochando da minha mãe eu sei que ele era muito mais do que aquilo que eu via e sentia. E até me ajudou porque eu transformei toda aquela indiferença em combustível e me abasteço para ser diferente de uma certa forma errada ou não em querer provar que sou que posso …. pura besteira…. eu não tenho nem preciso nada disso… mas….. e aí? Como faz para curar essa dor.

    Depois de 2 anos. Veio a morte do meu esposo. Meu porto seguro
    O grande amor da minha vida. O homem que foi pra mim meu pai, irmão, professor, amante amigo e melhor companheiro da vida e ainda me presenteou com uma filha maravilhosa. Falando só de morte, senão será outro livro kkk. Tínhamos 20 anos de diferença de idade. Isso foi o fermento certo que trouxe o equilíbrio, paixão e fez crescer essa admiração carinho tesão e amor.

    Ele estava com 59 anos tinha muita paixão e vontade de viver e era muito carinhoso atencioso e companheiro. Éramos muito cúmplices leal e transparente. Ele lia meus pensamentos era prestativo com todos. E melhor jogador de xadrez que conheci kkkl e ensinava nossa filha ser auto suficiente isso as vezes discordava kkkk era mais ciúmes mesmo. Saudável ríamos e ele era para nossa filha o que eu nunca tive do meu pai.
    Viajamos num feriado prolongado para praia e seu irmão pediu para que fossemos até a casa dele que ficava no caminho. Pegamos 7 horas de trânsito na estrada rimos muito no caminho. Eu dirigindo ele brincando com nossa filha de 14 anos ouvindo música. Enfim paramos em São Vicente onde seu irmão e a toda família nos esperávamos.. fomos até a feirinha passear eu minha filha cunhada e crianças e deixamos os dois irmãos em casa para conversar. Voltamos pedimos pizza e o irmão resolveu abrir um vinho e ficou meia hora falando a história do vinho e todos rindo felizes e abre logo a pizza vai esfriar… e bla bla bla….

    Por ser tarde resolvemos ficar por lá e seguir viagem no dia seguinte. Subimos era um sobrado e ficamos num quarto com duas camas de solteiro e foi colocado mais um colchão no chão pra minha filha. Como fazíamos todas as noites trocávamos algumas palavras eu perguntei se estava tudo bem com seu irmão… ele disse. Acho que sim na verdade falamos de pescaria música rimos.e fiquei esperando ele se abrir… mas não falou nada além do habitual, vai ver ele deixou pra falar amanhã antes de partirmos. E abraçou minha filha como sempre fez brincou comigo os dois sempre ficavam tirando sarro de alguma coisinha pra me irritar o que sempre terminava os três abraçados rindo e beijinhos. No rosto. Ela foi pro colchão eu fiquei de frente com ele cada um em sua cama e de mãos dadas no vão e ele como toda noite muito carinhoso disse. Boa noite filha… Mimi com anjos. Papai do céu te proteja amém e ela respondia amém e me olhou e disse o mesmo e eu respondi. Amém te amo bizunguinho e ele respondeu. ” Eu amo tu nuio” era o nosso jeitinho carinhoso todos os dias antes dormir…..

    Era 6h28 do dia 13 de outubro de 2002 acordei assustada com um barulho ele caindo da cama se debatendo e urinando e minha filha assustada ele olhou pra ela e depois trouxe o olhar pra mim e soltou um suspiro profundo e caiu a cabeça, comecei a fazer respiração boca a boca e massagem cardíaca e minha filha gritava para mãe ele se foi e eu não parava… e pedia ajuda.

    Peguei ele não sei como até hoje me pergunto e desci as escadas com ele nas costas enfiei no carro e sai feito louca buzinando e falando pra ele … fala comigo … fala comigo e cheguei. No hospital há duas quadras da casa e vieram correndo e colocaram ele numa maca desci do carro e fui atrás correndo até uma porta se fechar depois que ele passou e dois seguranças me impediram de passar quando senti alguém jogando sobre meu corpo um roupão. Era minha filha e um dos sobrinhos. Foi então que percebi que estava descalça e de baby Doll.

    Alguns minutos depois chegou a confirmação do que todos já sabiam e eu não queria acreditar. Minha filha de 14 anos me abraçou e me trouxe o conforto que eu deveria estar dando a ela….

    Não chorei uma lágrima tomei todas as providências necessárias. Avisei toda a família os filhos e até a ex esposa que é um capítulo a parte . Precisei chamar o médico dele que por ser feriado estava em Ubatuba e mais um médico amigo para poder assinar e liberar o corpo. Uma vez que ele morreu em casa. E não no hospital. Fui numa loja e comprei roupas cueca meias e eu mesma o vesti com ajuda do filho mais velho e o profissional da funerária. Fizemos dois velórios um em Santos onde estávamos e na madrugada subimos a serra e fizemos um breve na vila alpina onde ele foi cremado conforme seu desejo. E eu e minha filha lá sem uma lágrima no rosto. Chegavam os amigos os familiares até quem eu não conhecia. Estive presente no velório o tempo todo subi dirigindo meu carro com minha filha e a ex mulher atrás do carro da funerária . Fui recebida no cemitério
    Por alguns amigos e familiares daqui e terminei o que precisava ser feito..

    Estava anestesiada. Não chorava não sentia nada…. terminou todos se despediram de mim e da minha filha. E eu quis voltar pra minha casa dirigindo sozinha ao lado da minha filha.

    Quando entrei em casa descarregue i o carro e sentei..
    Meu mundo caiu…. entrei em desespero e sentia que ia morrer me deu falta de ar palpitação e uma dor física horrível… fiquei prostrada alguns dias semana na cama. A única pessoa que não saia do meu lado era minha filha de 14 anos….
    Comecei emagrecer. Perdi 28 kilos fui ao fundo do posso e chorava muito. Esqueci da minha própria filha e sua dor..

    Meu trabalho estava falindo nada dava certo e eu achava que não ia sobreviver. Os amigos e familiares se afastaram falavam que eu devia estar com AIDS. E assim se passaram 10 meses.

    Um dia minha filha me falou…
    Pará que eu não aguento mais você se fazendo de coitadinha. Cadê aquela mulher forte e corajosa que cuidou da vovó (paterna) do meu pai de mim..
    Meu pai tá triste porque tudo que ele sempre me passou foi que a Vida segue não importa o que aconteça tudo passa. Lembra? . você também sempre me disse isso…Tudo passa… tudo passa.

    E porque com você e diferente porque não passa?
    Aquilo caiu como um balde de água fria….
    Acorda mãe. Arruma um namorado vai dançar sai com suas amigas do trabalho… e foi assim que depois de 10 meses de luto e sofrimento profundo. Percebi que me coloquei num lugar de coitadinha e ninguém tava nem aí pra mim. Além do mais tinha responsabilidade por uma filha as contas estavam Aumentando e não estava rendendo no meu trabalho e que os problemas do cresciam.

    Resolvi entrar numa escola de dança me permiti conhecer pessoas e me concentrei mais no trabalho e em dois três anos estava recuperada numa outra esfera. Trazia no meu coração a tranquilidade de que fui e fiz por ele tudo que era pra ser feito. Fomos felizes juntos por 18 anos e a morte que mais uma vez veio para minha vida levando os meus homens irmão pai e esposo só estava cumprindo seu papel de arrebatar aqueles que encerrou seu tempo aqui. Agora cabia a mim continuar e levar o que eles me deixaram de melhor e aprender alguma coisa.

    Passado 18 anos veio a morte da minha mãe uma mulher forte guerreira empoderada com seu jeitinho matuto foi a frente criando 8 filhos 16 netos e 5 bisnetos. Seus últimos 10 anos de vida estive ao seu lado dia e noite cuidei dei carinho atenção conheci uma mãe que não conhecia antes e rimos muito e nos divertimos também. Ela tinha suas mágoas e não perdoava suas frustração por não ter feito algumas coisas e suas alegrias por tantas outras. Se sentia orgulhosa da construção familiar e se sentia o tronco e era.. alguns galhos floridos e belos outros fazendo papel de figurantes em sua árvore e alguns podres quebrados com cupim

    E atire a primeira pedra quem não têm essa configuração em sua vida. Uns mais outros menos.

    Ela se foi à 2 anos atras confesso que sinto saudades das nossas conversas antes de dormi do seu jeitinho carinhoso que só eu aproveitei dela viver a vida. E os momentos juntos nas viagens passeios. Não sofri e nem sofro com sua partida. Guardo com muito carinho tudo de bom o que ela significou pra mim e vai significar sempre. Os valores que me ensinou e a pessoa incrível que ela foi. Uma mulher de superação determinação e garra. Sempre teve um amor e falava de seu pai como a força a referência de vida que mesmo em suas confusões mentais nunca o esqueceu. Minha mãe te amo e sempre vou te amar. Saudades sim tristeza não…

    É isso 4 mortes 4 momentos difíceis 4 reflexões e um único aprendizado. A morte é certa então vamos fazer falar hoje aqui e agora, para quando ela chegar sem aviso prévio não termos remorsos . E se for. Nós o passageiro. Ter sido importante pra alguém. Eu hoje acredito que tudo o que eu desejo é ser importante na vida de alguém assim como tenho pessoas queridas e importantes na minha vida. Independente de laços de família e não me refiro a pertencimento e sim SER IMPORTANTE.

    ABRIL 2022 DIRCE VIEIRA.

  2. Luza Correia

    GRATIDÃO! Tenho certeza que meu filho Marcelo Correia não morreu continua e continuará vivo em meu coração para sempre. GRATIDÃO Luza Correia…

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